
Almada Negreiros e Pardal Monteiro
Essas duas anteriores ocasiões foram a Igreja de Nossa Senhora de Fátima, na Avenida de Berna em Lisboa, primeira igreja modernista construída no país no âmbito do movimento internacional renovador de arte cristã. Foi erguida entre 1934 e 1938, e Almada concebeu um extenso programa de vitral, mosaico cerâmico, pintura mural, e desenhou ainda um portão em ferro forjado de acesso ao batistério.
A seguir, Almada voltou a trabalhar com o arquitecto no edifício do Diário de Notícias, inaugurado em 1940 e um exemplo maior de arquitectura modernista em Lisboa. Foi um edifício especificamente pensado para albergar a redação de um jornal (hoje despojado da função para a qual foi concebido) e foi visitado por arquitectos de todo o mundo. Venceu o prémio Valmor de arquitectura nesse ano de 1940.
Quando Almada Negreiros recebeu a encomenda para fazer as pinturas murais das Gares Marítimas, já tinha trabalhado antes com o arquitecto Pardal Monteiro em duas ocasiões.
Ao mesmo tempo que projetava as Gares Marítimas, Pardal Monteiro recebia a tarefa de desenhar mais dois projetos nos quais Almada também colaboraria: a Cidade Universitária, onde Almada ficou responsável por todo o programa pictórico nas fachadas, feitas a desenho inciso pintado; e a remodelação do Ministério das Finanças na Praça do Comércio, para onde Almada faria duas pinturas a óleo e desenharia os cartões de duas tapeçarias. Estes dois projetos só se concretizariam na segunda metade da década de 1950. Almada seria ainda artista em destaque num outro projeto de Pardal Monteiro, o Hotel Ritz, para o qual concebeu um mural em mármore negro com desenho inciso a ouro e três tapeçarias. Pardal Monteiro escolhera também Almada para ser autor da enorme tapeçaria para a sala de leitura do seu último projeto, a Biblioteca Nacional. Mas com a morte do arquitecto em 1957, o projeto decorativo da sala de leitura foi antes entregue ao artista Guilherme Camarinha.
As pinturas que Almada fez para as duas gares são muito diferentes entre si, mas têm em comum incluírem representações da vida ribeirinha junto ao Tejo.
Nas gares marítimas Almada tinha à sua disposição uma área invulgarmente grande para pintura mural, e o objetivo era que ficasse perfeitamente integrada na arquitectura modernista de Pardal Monteiro. O espaço previsto para estas pinturas ficava no que os documentos oficiais chamam de «vestíbulo», mas que ficou conhecido por «salão nobre», e que era o lugar de embarque e desembarque de passageiros de primeira e segunda classe, com lojas de recordações e bancos fabricados na fábrica de móveis Olaio. Na Gare de Alcântara, Almada dispunha de 8 superfícies de 6,20 x 3,5 metros. Na Gare da Rocha do Conde de Óbidos tinha 6 superfícies de cerca de 7,2 x 3,8 metros. Nesta segunda gare, Almada contaria com o auxílio da sua mulher, a pintora Sarah Affonso, de forma a conter o orçamento na família. Foi ela quem fez o aumento progressivo dos esquissos até ficarem à escala e ajudou no processo da sua transferência para a parede.
As pinturas que Almada fez para as duas gares são muito diferentes entre si, mas têm em comum incluírem representações da vida ribeirinha junto ao Tejo. A venda de peixe, os trabalhos mais duros, como o das carvoeiras, e a pobreza associada às profissões que se podiam observar no rio, seriam elevadas a monumento nas pinturas murais de Almada.